Caos a vista! Aumento da compra de uniformes militares, ex-soldados empolgados e muita gente querendo quebrar tudo... Uma sopa que pode retroceder o país em 30 anos.


Um causo e algumas opiniões pessoais

E
m 2016 eu já administrava a Revista Sociedade Militar, em setembro ou outubro desse ano, não lembro exatamente a data, alguns intervencionistas entraram em contato comigo, viam em nós um possível apoio por sermos a única publicação desse nicho que na época ousava tocar em pontos até então considerados tabus para os militares, como questões políticas envolvendo a tropa, críticas contra o governo (que na época era de esquerda) feitas por militares da reserva etc., e por acompanhar os movimentos dos próprios intervencionistas sempre de perto e desde o seu início.

No contato me explicaram que iriam tentar invadir o Congresso Nacional com uma lista de reivindicações entre elas o fim dos supersalários e que só sairiam de lá depois que um representante das forças armadas os atendesse. Disseram pra manter em sigilo a coisa e que a ação poderia convencer os militares a realizar uma intervenção militar, que assim seriam convencidos de que a sociedade os apoiaria nisso.

Não acreditei que teriam coragem de colocar em prática a empreitada, um tanto quanto ousada, mas mesmo assim expliquei que esse tipo de coisa não cabe em um estado de direito, que alguém poderia se machucar, que não havia possibilidade de um general atendê-los, que não cabe às Forças Armadas intervir na política e que o máximo que conseguiriam era sair de lá presos.

Não receberam muito bem o meu conselho. Como sempre, fomos chamados de melancias, comunista e essas coisas. Disseram até que a Revista Sociedade Militar era financiada pelos chineses. 

Daí surgiu uma “ondinha” de ataques contra minha pessoa e nossa publicação.

Realmente em novembro de 2016 cerca de 50 pessoas invadiram a Câmara dos Deputados, justamente na hora em que um militar discursava, o deputado capitão Augusto. Não foram atendidos em absolutamente nada, não foram ouvidos por um general - as Forças Armadas não se metem nesse tipo de coisa - não conseguiram o atendimento de nenhuma das reivindicações e acabaram sendo ridicularizados pela mídia.



Agora, 5 anos depois e justamente quando o país tem um presidente de direita, vemos a coisa se repetir em dimensão bem maior. Em sete de setembro é possível que se quebre os vidros do STF e a portaria do Congresso Nacional, mas isso não significará expulsar os ministros ou os deputados de lá. Aliás, eles estarão certamente em casa vendo tudo pela televisão, gozando de suas regalias e de seus supersalários que – aliás – agora foram concedidos também para os generais que exercem cargos no governo.

E se quebrarem as vidraças, portarias, roletas...  e entrarem no Supremo Tribunal Federal, vão fazer o que depois, vão empossar quem como ministro do STF?

Nossa democracia, que evidentemente ainda está em crescimento, em consolidação, não se sustenta sobre prédios e vidraças e não vai ser uma quebradeira geral que vai nos fazer retroceder até os anos 50 ou 60, ainda que muitos – de vários espectros políticos – insistam em reviver esse período no seu dia-a-dia.

Mas, felizmente, não são a maioria, não passam de uma malta barulhosa.

Pelo que soube por meio de portais de notícias, tem muita gente comprando uniformes militares e há pessoas que - tendo apenas prestado serviço militar inicial - que se autodenominam veteranos das Forças armadas - falando na formação de “pelotões”, dizendo que reservistas devem orientar o povo para o "combate".



Isso é muito perigoso! 

O paisano não pode se sentir como um militar, muito menos pode sentir-se no direito de aplicar a força para fazer valer sua visão de mundo e é preocupante quando percebemos que todas as vezes que há um período de crise, de insatisfação, joga-se nos militares a responsabilidade por "acertar os eixos" do caos em que nos metemos. 

Uma sociedade que não consegue resolver os próprios problemas tende a se manter sempre como uma espécie de adolescente político, permanecendo imatura e incapaz de encontrar formulas pacíficas de resolver os problemas do país.

Quem incentiva o uso da força para resolver questões políticas corre um risco muito grande de fazer com que pessoas se machuquem.

Como há muita gente bem empolgada é preciso lembrar também que, segundo a CF1988, ninguém pode levar armas para uma manifestação, nem mesmo militares de folga.

Há alguns anos, quando a esquerda comentou sobre um tal “exército” de Lula, militares e conservadores em geral rechaçaram as declarações, diziam que o Brasil possui um só Exército, o de Caxias. Instigo-os a dizer a mesma coisa novamente.

Muitas vezes no passado ouvi pessoas comentando sobre a necessidade dos líderes de esquerda declarar – em relação ao MST – que não se deveria fechar estradas ou invadir terra alheia, manifestando-se claramente quanto ao fato desse tipo de coisa se configurar como crime. Hoje percebo que o governo age exatamente do mesmo jeito não dissuadindo seus seguidores de cometer crimes.

É preciso ser bem claro, chega desse papo de 4 linhas, de artigo 142 e frases de duplo sentido, que sempre deixam algo implícito. É necessário que o presidente diga que não apoia invasão de prédios públicos, que não apoia deposição pela força de detentores de cargo público, que não apoia o uso da violência para alcançar objetivos políticos.

Mais uma vez, como ocorreram antes de outras manifestações a favor de Bolsonaro, ouve-se pessoas dizer coisas como: _agora vai, é a última manifestação, é a nova independência!

Qualquer um que ousa parar pra pensar enxerga que essa coisa toda pode terminar em tragédia, em gente morta e – por fim – se isso acontecer, é provável que o Presidente da República seja responsabilizado e que a coisa acabe justamente na deposição do líder de direita que esse povo tanto lutou para emplacar como presidente da república.

Lamento muito tudo isso!

Robson Augusto é militar na reserva remunerada, cientista social e jornalista

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